É tarefa mais do que delicada escrever a respeito do massacre ocorrido ontem, dia 07 de abril de 2011, na escola Municipal Tasso de Silveira, em Realengo, Rio de Janeiro. Tamanha violência atinge a todos e todas, mas certamente, não conseguimos imaginar e de fato não sentimos a mesma dor de familiares, amigos e amigas, que neste momento enterram as crianças e adolescentes assassinadas ou ansiosamente aguardam a recuperação das ainda internadas.
Até este momento, são 12 crianças e adolescentes mortas e vários outras que foram feridas, sendo que 11 continuam internadas, quatro (04) em estado grave.
As primeiras notícias informavam que Wellington havia atirado “indiscriminadamente na direção de vários adolescentes”, no entanto, aos poucos, ficamos sabendo que o cenário, de fato, não foi este. Após divulgada a lista com o nome das vítimas começou a se desvendar a tragédia dentro da tragédia. As vítimas foram executadas com tiros desferidos há uma distância muito pequena e na maioria dos casos, houve uma seleção de quem deveria morrer.
Das 12 vítimas letais, 10 eram meninas entre 12 e 14 anos. De acordo com um aluno de 13 anos, testemunha do crime, “Ele matava as meninas com tiros na cabeça. Nas meninas, ele atirava pra matar. Nos meninos, os tiros eram só para machucar, nos braços ou nas pernas.”.
A morte de uma criança ou adolescente é sentida da mesma forma, seja de uma menina ou menino. Toda a população espera a recuperação dos que seguem internados, sejam meninas ou meninos. Mas mesmo assim, não podemos deixar de lado que dentro da tragédia, uma violência de gênero foi perpetrada. O autor, um homem jovem, as vítimas, em sua maioria, do sexo feminino. Estas 10 garotas foram executadas não apenas por estudarem na escola Municipal Tasso de Silveira, mas também pelo simples fato de serem do sexo feminino.
Muito se fala agora do Massacre da escola Columbine (Colorado, Estados Unidos), quando em 1999, dois estudantes, Eric Harris, 18 anos e Dylan Klebold, 17 anos,assassinaram 13 pessoas (oito alunos, quatro alunas e um professor) e feriram 21 (13 alunos e oito alunas).
No entanto, o que aconteceu ontem na escola Municipal Tasso de Silveira lembra ainda mais outro massacre, acontecido em Montreal, em 1989. A diferença entre os acontecimentos é que a nossa tragédia foi perpetrada contra crianças e adolescentes, enquanto que no Canadá, contra adultos jovens.
“Massacre de Montreal”, Canadá, 6 de dezembro de 1989. Marc Lepine (25 anos) entrou numa sala de aula da Escola Politécnica de Montreal, 48 alunas e alunos estavam na sala. Ele sacou um rifle semi-automático do casaco e ordenou que as mulheres ficassem de um lado da sala e os homens no outro, depois, deu tiros para cima e ordenou que os homens se retirassem. Após a saída dos homens, ele começou a executar as mulheres. Saiu da sala e continuou pelos corredores da escola, caçando mulheres. Gritava “Eu só quero as mulheres! Eu odeio as feministas!”. Matou 14 mulheres, feriu outras 13. Apenas um homem foi ferido. Se matou quando a munição estava perto de acabar
Falemos das questões psicopatológicas do assassino (sem esquecer que numa cultura machista são os homens aqueles mais "atingidos" por enfermidades mentais), falemos de bullying (este sim, que independe do sexo) dos envolvidos falemos da segurança das escolas, falemos de religiões (cujos fundamente em geral reproduzem a cultura machista), falemos da tragédia cotidiana brasileira causada pelo fácil acesso a armas de fogo e munição (cujos autores são, em sua grande maioria homens)... mas falemos devemos falar da violência de gênero que de fato aconteceu, da violência que foi principalmente direcionada às meninas e garotas desta escola.
Nos perguntemos “Que loucura é essa que prioriza meninas para matar?”. 22 anos depois do Massacre de Montreal, temos tristemente a nossa versão... Que loucura é essa que deseja eliminar meninas, garotas, mulheres? E por que até o momento este lado da tragédia tem sido tão pouco abordado?
Por favor, não leiam esta mensagem como totalitária ou reducionista. É antes de tudo uma, entre tantas leituras possíveis e necessárias (parcias e provisórias) sobre um evento, que não se explica, mas que nos impulsiona a pensar sobre várias dimensões de nossa vida em sociedade, sobre a pedagogia da violência que orienta nossas relações e que, muitas vezes, são vistas como normais, corriqueiras, cotidianas.
Rede de Homens pela Equidade de Gênero (RHEG)
A RHEG congrega um conjunto de organizações da sociedade civil que atuam na promoção dos direitos humanos, com vistas a uma sociedade mais justa com equidade de direitos entre homens e mulheres. A Campanha do Laço Branco é a principal ação da Rede, a qual compreende um conjunto de estratégias de comunicação com vistas a sensibilizar, envolver e mobilizar os homens no engajamento pelo fim da violência contra as mulheres.
Integram a RHEG: Instituto Papai (PE), Núcleo de Pesquisas em Gênero e Masculinidades (Gema/UFPE); Instituto NOOS de Pesquisas Sistêmicas e Desenvolvimentos de Redes Sociais (RJ), Instituto Promundo (RJ), Coletivo Feminista (SP), ECOS - Comunicação em Sexualidade (SP), Margens/UFSC e Themis (RS).
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FONTE : ABRAPSO
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